Título: Construções modais com ter: gramaticalização e variação
Orientador: Maria da Conceição Paiva
Páginas:246
Linha de pesquisa: Língua e Sociedade
Nesta tese, investigamos o uso das construções modais ter de + infinitivo e ter que + infinitivo, no PB contemporâneo, em duas perspectivas. Na primeira, focalizamos ter que + infinitivo, soberana na modalidade falada, através de um estudo em tempo real de curta duração do tipo tendência, procurando verificar a emergência de novos valores modais para essa perífrase. Partimos da hipótese de que, inicialmente gramaticalizada no domínio deôntico, essa perífrase prossegue uma trajetória unidirecional de mudança no sentido de [-subjetivo] > [+subjetivo]. Para verificar essa hipótese, foram utilizados dados de entrevistas sociolinguísticas que compõem as Amostras Censo 1980 e Censo 2000, representativas de duas sincronias da variedade carioca. Com o objetivo de identificar as propriedades mais relevantes dessas perífrases, foram analisados os valores modais dessas construções, as propriedades modo-temporais e número-pessoais do verbo ter, as propriedades semânticas, o tipo sintático e de processo de V2, as propriedades semântico-discursivas do contexto e as variáveis faixa etária, gênero/sexo. Os resultados obtidos mostram que ter que + infinitivo caracteriza-se por apresentar o verbo ter no presente do indicativo e na terceira pessoa do singular; V2 associa-se a sujeitos com o traço semântico [+humano] e [+arbitrário]. Mais frequentemente, as orações com a construção ter que + infinitivo situam-se em contextos discursivos nos quais emergem relações no domínio da causalidade. O processo de mudança verificado entre as duas sincronias foi identificado através do continuum entre obrigação/necessidade [+forte] > [-forte]. A variável social faixa etária demonstrou o uso mais expressivo da construção ter que + infinitivo nas faixas intermediárias, com queda significativa nas faixas extremas. A variável gênero revelou que as mulheres tendem a usar mais essa variante com seu valor deôntico e extrínseco e os homens, com o valor epistêmico. Na segunda dimensão da pesquisa, focalizamos a variação entre as duas construções na modalidade escrita, com o objetivo principal de identificar os contextos de resistência de ter de + infinitivo. Para essa análise utilizamos uma amostra do discurso jornalístico constituída de textos representativos de diversos gêneros, publicados durante o período de 2000 a 2004. Os resultados obtidos mostram que essa construção tende a ocorrer no domínio epistêmico, em contextos de primeira pessoa, de sujeito [+humano], de verbos de processo mental, percorrendo um cline de significados [-subjetivo] > [+subjetivo]. Verificamos, também, a correlação entre os valores modais das construções com ter e os diversos gêneros da mídia jornalística. Os resultados demonstraram que a construção ter de + infinitivo tende a ser mais utilizada em gêneros mais formais, como os editoriais.