Orientador: Prof(a). Dr(a). Christina Abreu Gomes
Páginas: 164
Resumo
Estudos sobre interações por chats no português brasileiro têm atestado que as variantes nulas
do sujeito de 1ª pessoa do singular e do objeto direto anafórico de 3ª pessoa predominam em
dados de produção (Guimarães, 2024; Pinheiro, 2017; 2021). Além disso, pesquisas sobre a
língua inglesa também indicam que o sujeito nulo de 1ª pessoa do singular é recorrente na
escrita digital informal (Rafi, 2014; Herring, 2012; Weir, 2012; Murray, 2000; inter alia), ao
que Weir (2017) acrescenta a ausência de expressão explícita de complementos verbais de 3ª
pessoa. Nesta investigação, adotamos, pois, a hipótese de que as variantes nulas de sujeito e
objeto podem estar cognitivamente correlacionadas a determinados gêneros da comunicação
digital, como chats. Desse modo, propomos uma conjugação de princípios da
Sociolinguística Variacionista (Labov, 2008 [1972]; Weinreich, Labov e Herzog, 2006
[1968]), dos Modelos Baseados no Uso (Bybee, 2010; Cristófaro Silva e Gomes, 2020) e da
análise bakhtiniana de gêneros discursivos (Bakhtin, 1997). Entendemos que a
heterogeneidade sistemática é central na organização cognitiva do conhecimento linguístico,
que, por sua vez, incorpora tanto as formas variantes da língua, quanto aspectos da situação
comunicativa nas quais elas tipicamente se inscrevem, como os gêneros do discurso
(Pinheiro, Paredes Silva e Gomes, 2022). Assim, defendemos que os gêneros discursivos
fazem parte da organização cognitiva dos exemplares ou variantes de um padrão linguístico
variável. Para investigarmos essa hipótese, elaboramos um experimento de julgamento
sociolinguístico em que os participantes deveriam escolher entre diferentes formas do sujeito
de 1ª pessoa do singular e do objeto direto de 3ª pessoa em referência anafórica para dar
continuidade a interações que emulavam conversas de chat do aplicativo WhatsApp.
Participaram das aplicações 279 indivíduos, entre estudantes do 6º e do 9º anos do Ensino
Fundamental e da 3ª série do Ensino Médio, a fim de obtermos um panorama correspondente
à segunda metade da Educação Básica. Os estímulos criados para o experimento controlavam
(i) o interlocutor das conversas por chat: uma amiga do personagem do experimento, ou a
direção da sua escola; e (ii) o contexto sintático-discursivo favorável ou desfavorável às
variantes nulas de sujeito e objeto. Submetemos os dados obtidos ao tratamento estatístico
através de testes de qui-quadrado e da regressão logística de modelo misto, a fim de verificar
a relação entre as escolhas linguísticas dos participantes e os grupos de fatores controlados.
Os resultados confirmaram parcialmente a nossa hipótese. Por um lado, nos estímulos-alvo de
sujeito, predominaram escolhas pela variante nula, independentemente dos grupos de fatores
controlados. Por outro, os estímulos-alvo de objeto direto favoreceram não apenas o objeto
nulo – atestado em todos os contextos, com percentuais mais altos nas respostas da 3ª série do
Ensino Médio –, mas também o pronome nominativo, forma ainda combatida pela ação
escolar. Especialmente em cenários de maior monitoramento e formalidade, houve ainda
escolhas pelo clítico acusativo – variante que não esperávamos encontrar em interações por
chat –, por vezes com índices equiparáveis aos de sintagmas nominais anafóricos e até
mesmo do objeto nulo. Julgamos, assim, que os dados de sujeitos de 1ª pessoa nos
forneceram evidências para a correlação entre chats e a variante nula, corroborando a
hipótese de que tal variante tende a predominar na escrita digital informal, sobretudo devido à
agilidade na comunicação. Corrobora-se também a perspectiva de que os exemplares da
língua podem se armazenar na mente dos indivíduos junto aos gêneros discursivos em que
tendem a ocorrer. Já os estímulos de objeto direto confirmaram, tal como proposto por
Androutsopoulos (2011), que a escrita digital informal não deve ser caracterizada
exclusivamente através de comparações com as noções preestabelecidas da fala e da escrita
convencional, visto que a comunicação na Web está sujeita a pressões de diferentes
complexidades.
Palavras-chave: Comunicação digital; variação linguística; conhecimento linguístico; sujeito de 1ª pessoa do
singular; objeto direto anafórico de 3ª pessoa; chat online.
